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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Pitaco social - sobre a última semana e o Rio de Janeiro

Os jornais de hoje estão me deixando enojada com essa coisa de "vitória sobre o mal". Como carioca e "moradora de bairro onde nem táxi gosta de entrar depois das 22h", sei que há motivo para uma levantada de moral em relação ao ocorrido, mas também sei que não é tudo isso.

Sei q ninguém me perguntou nada e eu tentei falar o mínimo possível sobre essa operação, mas fiquei super irritada e preciso falar algumas coisas. É rápido, não vai doer:

Darei razão à esse frenesi descontrolado (leia-se: o fim do tráfico em qualquer favela) no dia em que encontrarem no mínimo as seguintes coisas em uma (ou várias) favelas - tem que ser em favela mesmo: 

1) fábrica de armas
2) fábrica de munição
3) plantação de maconha e coca em larga escala (plantação pra consumo próprio não vale)
4) laboratório e material para sintetizar coisas.

Caso não encontrem isso, meus caros, não tem sentido essa comemoração toda.

Você pode dizer que está comemorando a expulsão dos traficantes. E eu respondo: "rei morto, rei posto". É assim que funciona. Caso contrário, em cada morte de traficante, a atividade comercial seria parada completamente. E o cara não precisa nem estar armado para isso.

Você pode dizer que está comemorando a presença das forças armadas no morro, e eu respondo: "não é atribuição deles". Se eles querem colaborar - e isso é bem vindo - é impedindo a plantação e a distribuição, além de não venderem mais suas armas aos traficantes. Como disse anteriormente, não existe fábrica de armamento em morro algum, portanto...

Você pode estar comemorando a presença da polícia federal. E eu digo: "não é atribuição deles". Se eles querem colaborar - e isso é bem vindo - é impedindo a fuga de criminosos e a entrada e saída de drogas. E isso já é muita coisa pois, como disse anteriormente, nunca vi nenhuma grande plantação de coca em morro... 

Você pode estar comemorando a "liberdade dos moradores". E eu respondo: é idiota pensar que todo morador de morro compactua com a prática do crime (des)organizado. De fato o tráfico cria regras para a região que domina. Contudo, isso só acontece quando o Estado não se faz presente. Porque quando um carro de um morador é roubado, por exemplo, o cara não procura a polícia. Procura o dono, ou o chefe, da comunidade e vai relatar o roubo. Muitas vezes recupera. Não existe, claro, a figura do "bom marginal", mas muitas vezes o marginal faz um serviço tão porcamente competente quanto o serviço que o Estado deveria fazer. Tirando essa parte de assistência, a comunidade fica dependendo de um Estado que já não era presente. Espaço aberto para a milícia, que faz parte do Estado, mas não o é efetivamente. 

Você pode comemorar o "fim da venda de drogas" naquela região (!!). Acredite, tem gente que tá pensando isso (inclusive em relação à comunidades com UPP). E eu digo: o máximo que pode acontecer é inflacionar.  Vender droga pode ser uma atividade tão discreta quanto vender Avon. Existem vendedores no morro e no asfalto. Não adianta fechar só a boca de fumo, todo mundo sabe, mas ninguém fala sobre os bares, restaurantes, e pessoas que fazem exatamente a mesma coisa que um pé de chinelo faz, só que sem fuzil no pescoço. 

Pra fazer essas observações não precisa ser nem "bandido" nem policial. Tem coisas que só a vivência em um "bairro onde nem táxi gosta de entrar depois das 22h" nos dá.

É por essas e outras que eu concordo com Marcelo Freixo, e para isso cito esse artigo, do blog do jornalista Sidney Rezende:

Freixo usou a expressão "enxugando gelo" para se referir ao trabalho da Polícia Militar e do BOPE nas favelas cariocas para combate o tráfico de armas. Segundo ele, é um "equívoco histórico" tentar enfrentar e combater o crime só nos morros.

Pronto. Posso viver agora.

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